O Sermão da Montanha. Estudo Nº 23: O Nosso Irmão: Matando com o Coração e a Boca

Paisagem de planícies com rio e búfalos pastando, na frente texto ilustrando o estudo: O Sermão da Montanha. Estudo Nº 23: O Nosso Irmão: Matando com o Coração e a Boca

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O Sermão da Montanha

Mateus 5:21 e Mateus 5:22 Estudo Teológico Nº 23

Por Markus DaSilva, Th.D.

C

ontinuando a série sobre o Sermão da Montanha, após deixar claro para os seus discípulos que o tipo de retidão que presenciavam dia após dia nos escribas e fariseus não era aquilo que o Pai espera dos seus seguidores para que a graça da salvação seja alcançada, Jesus então inicia uma lista de exemplos bem específicos da correta obediência à lei de Deus. Estas palavras de Cristo certamente eram inéditas e incríveis para os seus ouvintes, pois todos eles, desde criancinhas, sempre tiveram os seus líderes religiosos como o perfeito modelo de santidade a ser seguido para assim agradar a Deus e entrar no Reino dos Céus. Algo que obviamente soou ainda mais incrível aos seus ouvidos é que, ao invés de Jesus dizer que os requerimentos do Pai para alguém entrar no Reino eram mais leves do que eles haviam até então aprendido dos líderes, o Senhor lhes disse que na realidade Deus exige muito mais disciplina do que se via nos religiosos: “Pois eu vos digo que, se a vossa retidão [Gr. δικαιοσύνη (dikiosíne) s.f. retidão, justiça] não exceder a dos escribas e fariseus, de modo nenhum entrareis no reino dos céus [Gr. βασίλειο των ουρανών (vasílio ton uranón) exp.idio. Reino dos Céus]” (Mat 5:20).

“Frequentemente esquecemos que toda a vida cristã é uma vida de fé, e fé transforma o impossível em possível, o conceito em realidade e o desejo em bênção.”

Como Podemos Exceder os Líderes Religiosos em Retidão?

Certamente assustados com as palavras de Jesus, a pergunta que então surgia na mente era: exceder em que? Como exceder os escribas e fariseus se eles eram os profissionais em tudo o que se conhecia a respeito de Deus? Eles ganhavam o seu salário estudando e pregando sobre as Escrituras. Como pode Jesus esperar que simples e iletrados camponeses, pastores de ovelhas e pescadores obtenha uma retidão superior à daqueles que frequentaram os melhores seminários, possuíam acesso aos livros sagrados e aprenderam dos mais respeitados professores de religião? (Mat 11:25). Foi para dissipar estas dúvidas que Jesus esclareceu a sua frase utilizando de seis exemplos que demonstra como a retidão ensinada e praticada pelos escribas e fariseus, apesar de possuir uma aparência de santidade, deixava muito a desejar quanto à retidão que o Pai espera dos seus seguidores. Após cada exemplo, Jesus explicou qual é a correta observância para cada um destes mandamentos.

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O Judaísmo e a Lei nos Dias de Jesus

A lei de Deus era a base que sustentava todo o sistema político-religioso do judaísmo nos dias de Jesus. Os escribas e fariseus, no entanto, utilizavam dos mandamentos de Deus não com o objetivo de estabelecer um ambiente de amor e justiça entre os seus irmãos e preparar a nação para o estabelecimento do Reino dos Céus, mas sim para o ganho próprio (Mat 23:18). Eles se limitavam à letra da lei, pregando uma versão de Deus distorcida: sem amor, sem perdão, sem misericórdia, sem a graça, e focada na lei cerimonial: “Ide, porém, e aprendei o que significa: Misericórdia [Gr. έλεος (éleos) s.n. misericórdia, pena, compaixão] quero e não sacrifícios [Gr. θυσία (thisia) s.f. sacrifício, vítima]” (Mat 9:13). [Acessar estudo sobre a Letra da Lei e o Espírito da Lei]

Os Líderes Judeus e a Manipulação da Lei de Deus

Os escribas e fariseus ensinavam uma observância da lei superficial; restrita somente àquilo que foi escrito no Sinai e todas as adições posteriores que lhes convinham, conhecidas como: “as tradições dos anciãos” [την παραδοσιν των πρεσβυτερων (ten paradosin ton presbitéron)] (Mar 7:3). Eles consideravam a lei de Deus da mesma forma que alguém considera um contrato entre homens; assinado e lavrado em cartório e que, quando necessário, pode ser revista, alterada e promulgada. Eles mesmos criavam cláusulas e as associavam aos santos mandamentos do Senhor, de acordo com as suas conveniências, e as apresentavam ao povo como se viesse do próprio Deus. Um bom exemplo desta tática foi o que fizeram com o quinto mandamento: “Honra a teu pai e a tua mãe, para que se prolonguem os teus dias na terra que o Senhor [Heb. יהוה‎ (Yerrovah) np.div. Jeová, Javé] teu Deus [Heb. אלהים (Elohim) s.m. sent.prim. Deus; sent.sec. deuses, seres celestes] te dá” (Exo 20:12). Para aumentar a entrada nos seus cofres, inventaram o “corbã”, uma cláusula adicionada ao mandamento que isentava os filhos de ajudar financeiramente aos seus pais idosos, desde que o dinheiro fosse doado ao templo (Mat 15:3-6). A vantagem desta manobra era que o doador adquiria prestígio na comunidade religiosa, sem que fosse necessário um custo adicional. Os seus pais, obviamente, eram negligenciados no processo. Absurdos como esse sempre ocorrerão quando o homem se acha na liberdade de manipular os mandamentos de Deus segundo a sua conveniência, e esta liberdade apenas ocorre quando a pessoa não vê a lei de Deus como um prazer, mas sim como uma árdua obrigação a ser cumprida: “Porque este é o amor [Gr. αγάπη (agape) s.f. amor] de Deus, que guardemos os seus mandamentos [Gr. εντολή (endolí) s.f. ordem, comando, regra, mandamento]; e os seus mandamentos não são penosos” (1Jo 5:3).

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A Ira Contra o Nosso Irmão

O primeiro dos exemplos de Jesus é quanto ao sexto mandamento da lei de Deus (quinto na Bíblia Católica): “Ouvistes que foi dito aos antigos: Não matarás; e, quem matar estará sujeito a julgamento. Eu, porém, vos digo que todo aquele que se irar contra seu irmão, estará sujeito a julgamento; e quem disser a seu irmão: “Raca!”, será levado ao tribunal; e quem lhe disser: “Tolo!”, corre o risco de ir para o fogo do inferno” (Mat 5:21-22. Ver também: Exo 20:13; Deut 5:17).

Muito Antes de Moisés o Povo de Deus já Conhecia a Sua Santa Lei

Os antigos a quem Jesus se refere são todos os escolhidos do Senhor desde a queda do homem até a sua vinda. Muito embora os mandamentos de Deus foram colocados de uma forma mais clara e organizada durante os 40 anos que a nação de Israel passou no deserto após a sua saída do Egito, a realidade é que o povo de Deus sempre teve conhecimento dos preceitos do Criador. Em relação ao pecado de assassinato, por exemplo, em Gênesis o Senhor já se pronunciava quanto a esse mandamento: “Quem derramar sangue de homem [Heb. אדם (adam) s.m. homem, pessoa, ser humano], pelo homem terá o seu sangue derramado; porque Deus [Heb. אלהים (Elohim)] fez o homem à sua imagem” (Gen 9:6). Podemos observar o mesmo em relação ao quarto mandamento que lida com o dia de descanso: “Abençoou Deus o sétimo dia, e o santificou; porque nele descansou de toda a sua obra que criara e fizera” (Gen 2:3). E ainda sobre o sétimo mandamento, se referindo ao pecado de adultério: “Deus, porém, veio a Abimeleque, em sonhos, de noite, e disse-lhe: Eis que estás para morrer por causa da mulher que tomaste; porque ela tem marido” (Gen 20:3). E finalmente, podemos ver Deus se referindo a todos os seus mandamentos e estatutos no seu diálogo com Isaque: “…porquanto Abraão obedeceu à minha voz, e obedeceu às minhas ordens, os meus mandamentos [Heb. מצוה (mitzvá) s.f. mandamentos, preceitos], os meus estatutos [Heb. חֹק‎ (rrôk) s.m. estatutos, ordenanças] e as minhas leis [Heb. תורה (tôrrá) s.f. lei, torá] ” (Gen 26:5). Todos esses exemplos nas Sagradas Escrituras ocorreram séculos antes do nascimento de Moisés.

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Como os Líderes Judeus Praticavam o Mandamento: Não Matarás

Mas voltando ao sexto mandamento. Até então: “não matarás”, era ensinado pelos líderes religiosos como sendo um estatuto ligado apenas à parte física do ser humano, ou seja, a única forma de quebrar o sexto mandamento seria retirando intencionalmente a vida de uma pessoa. Qualquer outra ofensa ao irmão, desde que a sua vida fosse preservada, não seria considerada pecado de morte. Este entendimento limitado da lei de Deus era devido ao coração rebelde que o povo judeu sempre possuiu (Mat 19:8; Mar 3:5). Não deveria ter sido assim, pois nas Sagradas Escrituras encontramos inúmeras passagens inspiradas por Deus que indicavam o caráter espiritual dos seus mandamentos: “Sonda-me, ó Deus [Heb. אל (El) Deus], e conhece o meu coração [Heb. לבב (lêiváv) s.m. coração; fig. alma, mente, caráter]; prova-me [Heb. בחן (barran) v. examinar, testar, provar], e conhece os meus pensamentos; vê se há em mim uma inclinação para o que é errado [Heb. אם דרך עצב (im bérrerk ócsev) Lit. se existe um caminho de ídolos], e guia-me pelo caminho eterno [Heb. בדרך עולם (bê bérrerk olam) no caminho da eternidade]” (Sal 139:23-24. Ver também: Sal 26:2; Prov 24:17-18). A atitude dos líderes em ensinar apenas o aspecto superficial, ou a letra da lei de Deus não tinha razão de ser, eles não tinham desculpas, pois nunca lhes foi oculto que é do coração, da parte mais íntima e espiritual do homem, que procede toda a ofensa a Deus: “Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e perverso; quem o poderá conhecer? Eu, o Senhor, esquadrinho a mente, eu provo o coração; e isso para dar a cada um segundo os seus caminhos e segundo o fruto das suas ações” (Jer 17:9-10. Ver também: Mar 7:21-23).

O Matar Segundo a Letra da Lei e Segundo o Espírito da Lei

Jesus primeiro esclarece que para Deus começamos a matar o nosso irmão assim que nos iramos contra ele. Ou seja, enquanto a letra da lei se limita ao ato final do assassinato, o espírito da lei foca no primeiro passo, que se não for eliminado, levará à sua evolução natural que é a morte de quem nos ofende. A letra, que é inferior, lida com a consumação do pecado, enquanto o espírito, que é superior, foca na sua raiz: “Pois é do interior, do coração [Gr. καρδία (kardía) s.f. coração; fig. inclinação e desejos do homem] dos homens, que procedem os maus pensamentos, as prostituições [Gr. πορνεία (pornia) s.f. imoralidade, prostituição, fornicação], os furtos, os homicídios, os adultérios [Gr. μοιχεία (mirría) s.f. adultério, adúltero]” (Mar 7:21). Caso a contrariedade que temos com o nosso irmão não seja interrompida na sua raiz, ou quando começamos a sentir raiva da pessoa, o próximo passo é começarmos a desejar todo o tipo de mal contra ela. Começamos também a observar todos os defeitos que a pessoa possui, tanto defeitos reais como imaginários, e cada vez mais aumenta o nosso desprazer com a pessoa. Jesus explicou esta evolução do mal, indo da ira para um insulto simples até uma expressão de ódio com os termos: ira, raca e tolo [οργίζω, ρακα, μωρός (orgizo, raca, morós)]. A punição que recebemos por nossa atitude é proporcional a esta evolução que ocorre em nós: tribunal local, tribunal superior (Sinédrio) e no final o inferno [κρίσις, συνέδριον, γέεννα (krisis, sinédrion, geêna)]. Todo este linguajar envolvendo sentimentos, termos ofensivos e cortes comuns na época dos discípulos, foi a maneira que Jesus quis utilizar para nos dizer que o pecado de assassinato e a sua punição, que é o fogo do inferno, tem um início que ocorre não quando se pega a arma para tirar a vida da pessoa, mas sim quando surge os primeiros indícios de ira no coração. Foi isso o que o apóstolo João quis dizer quando nos escreveu: “Todo aquele que odeia [Gr. μισέω (miséo) v. odiar, detestar] a seu irmão é assassino; ora, vós sabeis que nenhum assassino tem a vida eterna [Gr. ζωήν αιώνιον (zoin eônion) exp.idio. vida eterna] dentro de si” (1Jo 3:15).

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A Vida Cristã é Uma Vida de Fé

Irmãos, eu sei que não se irar com as pessoas que convivemos no cotidiano parece algo impossível de ser feito, principalmente nos dias atuais onde nos relacionamos constantemente com dezenas de indivíduos: em casa, na escola, no trabalho, na rua, na igreja… e em vários outros locais. Nos próximos estudos desta série sobre o Sermão da Montanha, seguiremos falando a respeito dos demais mandamentos que Jesus usou como exemplo. De fato, todos eles, a princípio, parecem que Jesus está nos pedindo por algo que não temos como lhe dar. Essa aparente dificuldade, porém, se dá ao fato de que frequentemente esquecemos que toda a vida cristã é uma vida de fé (Hab 2:4; Rom 1:17; Heb 10:38), e fé transforma o impossível em possível, o conceito em realidade e o desejo em bênção.

Pela Fé Podemos Obedecer a Todos os Mandamentos de Deus

Pela fé — digo por experiência própria — podemos obedecer a todos os mandamentos do nosso querido Deus: Pai e Filho. Pela fé, aceitamos que, se o nosso Criador nos pede por algo, é porque Ele mesmo nos dará a capacidade de lhe dar aquilo que Ele pede. Pela fé então, saímos do teórico para o prático. Começamos a obedecer independentemente de sentimentos, pois a fé que funciona não se baseia em sentimentos, mas sim nas promessas Daquele que sempre se manteve fiel naquilo que promete: “Fiel é Deus [πιστός ο θεός  (pistos o Theos)], pelo qual fostes chamados para a comunhão de seu Filho Jesus Cristo [Gr. Ιησούς Χριστός (Iesús Kristós)] nosso Senhor” (1Cor 1:9). Espero te ver no céu.
 
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